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terça-feira, 26 de novembro de 2013

P193 - IX - O DESTACAMENTO DA PONTE DO RIO UDUNDUMA (Junto à estrada XIME-BAMBADINCA) [Parte 1]


MSG com data de 25NOV2013 (IX) de Jorge Araújo ex. Fur. Milº OP.Esp./Ranger - CART 3494 do BART 3873 - Guiné DEC71/ABR74

Caríssimo camarada Sousa de Castro,
Os meus melhores cumprimentos.
Na sequência das anteriores narrativas tendo por enquadramento histórico a «Ponta Coli» [Postes; 148; 152 e 191], eis outra, agora referente à presença dos camaradas militares da CART 3494 na «Ponte do Rio Udunduma».
Entre a “Ponta…” e a “Ponte…” o que muda é a vogal, uma vez que a substância da nossa missão era a mesma: «SEGURANÇA», mas em diferentes pontos [locais] na Estrada Xime-Bambadinca, afastados, entre si, meia-dúzia de quilómetros.
Ora leiam e comentem a 1.ª parte.
Obrigado.
Jorge Araújo.

Nov./2013.

GUINÉ
Jorge Alves Araújo, ex-Furriel Mil. Op. Esp./RANGER, CART 3494
(Xime-Mansambo, 1972/1974)
O DESTACAMENTO DA PONTE DO RIO UDUNDUMA
(XIME-BAMBADINCA)
- As acções especiais durante o 2.º semestre de 1973 [parte I] - 
1. A génese da segurança à Ponte do Rio Udunduma
     - Antecedentes históricos
A história diz-nos, enquanto memória de um passado que continua presente, que a segurança à 1.ª Ponte [velhinha] do Rio Udunduma, situada na Estrada Xime-Bambadinca, teve o seu início no dia 29 de Maio de 1969, 5.ª feira, na sequência da dupla acção do PAIGC, levada a cabo na noite do dia anterior (28/29.Mai69) por dois bigrupos (cerca de 100 elementos). Essas duas acções tiveram como alvos o ataque ao Aquartelamento de Bambadinca, sede, à época, do BCAÇ 2852 (1968/70), e, simultaneamente, à Ponte do Rio Udunduma, situada a cerca de quatro quilómetros desta localidade, a qual foi dinamitada, resultando desse acto ter ficado parcialmente danificada, conforme se pode observar nas imagens a baixo.
Foto 1 – Estrada Xime-Bambadinca [Ponte do Rio Udunduma – Jul/1973] – imagem de como ficou a ponte velha na sequência da explosão de 28Mai1969, obtida ao nível do solo.

Foto 2 – Estrada Xime-Bambadinca [Ponte do Rio Udunduma – Jul/1973] – imagem da ponte velha, obtida da nova estrada onde foi construída uma nova ponte sobre o rio, inaugurada entre finais de 1971 e início de 1972.
Os primeiros operacionais das NT a avançar para esse local foram os do 3.º GComb da CART 2339 (1968/69), sedeada em Mansambo, sob o comando do Furriel Carlos M. Santos (Vd Postes: 7459 e 7859)
Foto 3 – Estrada Xime-Bambadinca [Ponte do Rio Udunduma – Jul/1973] – imagem da estrada velha, assinalando-se a ponte semidestruída em 1969, e Bambadinca, ao fundo, como local mais próximo, a quatro quilómetros desta. Na linha do horizonte, vê-se a nova estrada na qual é possível contar uma coluna de mais de uma dezena de viaturas civis, em direcção ao Cais do Xime.
Recuperado o controlo daquela pequena fracção de terreno circunscrita ao afluente do Geba e da bolanha contígua, a Ponte do Rio Udunduma, mesmo depois de ter ficado bastante danificada, não mais voltou a estar/ficar desprotegida até ao fim da guerra de guerrilha [Abril/1974], devido à decisão de aí se instalar uma força militar [especial] que, com o decorrer do tempo, haveria de dar lugar à organização de um Destacamento [amostra de… ou mini…].
Entretanto, uma nova ponte haveria de ser construída a seu lado, a poucas dezenas de metros, maior e perfeitamente adequada ao grande fluxo rodoviário, civil e militar, que diariamente circulava nesta estrada, com ligação a toda a zona leste do território, com maior destaque para as localidades de Bafatá, Nova Lamego, Piche, Canquelifá, Galomaro e Saltinho. Segundo julgo saber, a sua construção esteve a cargo da empresa Tecnil, e a sua inauguração deverá ter ocorrido entre finais de 1971 e início de 1972.
Foto 4 – Estrada Xime-Bambadinca [Ponte do Rio Udunduma – Jul/1973] – imagem da nova ponte construída pela empresa Tecnil. Ela foi obtida da ponte velha.
Durante cinco anos, muitos foram os camaradas que aí permaneceram vigilantes, num contexto desprovido de qualquer rectaguarda de apoio militar, em que cada um de nós estava completamente abandonado à sorte da divina providência e à sua couraça, tendo como mais-valia a capacidade de sobrevivência, pois se tivesse acontecido algum ataque, ele seria sempre de surpresa, e, por esse método, nem os peixinhos se salvavam. Em suma: miserável e degradante, já que não tinha rigorosamente nada. Ou melhor, tinha o que as imagens abaixo deixam entender.

Foto 5 – Estrada Xime-Bambadinca [Ponte do Rio Udunduma – Jul/1973] – imagem de um buraco aberto no chão, coberto de troncos de palmeira, terra e chapas de zinco a cobri-los, protegido no exterior com bidões de gasóleo cheios de terra, com uma pequena abertura, tendo no seu interior uma cama de ferro, especial do mobiliário militar, com colchão adequado …a um sono tranquilo [que enorme ironia].
A cama tinha um mosquiteiro comprado em Bafatá, nas “libanesas”. Este acabaria por ter uma dupla função, na medida em que, protegendo-nos dos mosquitos e das melgas, servia também de cama elástica e/ou trampolim para treino de flexibilidade e destreza dos ratos do mato que nos visitavam durante a noite, em sessões contínuas. Para além desta actividade físico-desportiva em ginásio coberto, sem necessidade de inscrição prévia ou celebração de contrato de fidelização, a equipa de roedores ainda tinha a pouca vergonha de nos levar os sabonetes e as meias para a sua comunidade, algures nas redondezas, certamente muito importante na sua higiene.
Era, então, um contexto maravilhoso … e com muita animação.

Foto 6 – Estrada Xime-Bambadinca [Ponte do Rio Udunduma] – o mesmo chalé T0 quatro anos antes, com o camarada furriel Humberto Reis, do 2.º GComb da CCAÇ 12, em momento de reflexão (P7481-LG), aguardando… talvez: a passagem do carteiro? ou, ainda, uma boleia para a metrópole? Mas… só ele nos poderá dizer!
Entre o tempo das fotos 5 e 6 [quatro anos], outros camaradas por lá passaram de diversos Grupos de Combate destacados das Unidades instaladas naquele Sector (L1), considerado um dos de maior vastidão em todo o T.O., nomeadamente: CART 2339 (1969), de Mansambo – CART 2520 [1969 - 2 secções], do Xime – C.CAÇ 12 [1969-71], de Bambadinca – PEL CAÇ NAT 52 [1972] – PEL CAÇ NAT 63 [Out/1972] – CART 3493 [Mar/1973 - 2 secções], de Mansambo – CART 3494 [Abr/1973-74 - 1 secção +], de Mansambo-Xime.

2. As acções especiais durante o 2.º semestre de 1973
Com a transferência do Xime para Mansambo, ocorrida nos primeiros dias de Março de 1973, a CART 3494, através dos seus diferentes GComb, passou a ter uma agenda e missões muito distintas das que tinha tido anteriormente no Xime, o que é perfeitamente natural e normal, pois não havia [não há] dois contextos iguais.
No nosso caso, foi-nos atribuída mais uma missão especial: a de comandar uma secção + do meu pelotão [o 1.º], num total de doze elementos, com o objectivo de proteger a(s) Ponte(s) do Rio Udunduma, actividade que registava já quatro anos.
Avançámos com armas e [poucas] bagagens, na medida em que as condições logísticas e físicas do local eram incrivelmente pouco dignas e, por essa razão, um desafio permanente à superação de qualquer ser mortal.
Não havia nada … mas mesmo nada … com excepção de capim, três buracos no chão, muitos mosquitos e alguns ratos, conforme relatos anteriores. Electricidade cá tem. Água cá tem. Comida cá tem. Mas criatividade e improvisação… muita.
Dois petromax e a claridade da lua; alguns lustres de garrafas de cerveja; poucas velas de cera, reforçadas com meia-dúzia de isqueiros [os dos fumadores], era esta a panóplia de instrumentos que iluminavam os nossos olhos e ideias e aqueciam, simultaneamente, os nossos corações, durante as noites. Mas, como o ser humano é um ser de assimilação e de acomodação [tal como se verifica nos tempos de hoje], as semanas e os meses lá foram passando ao ritmo de… um dia de cada vez.
Esse ano de 1973 foi um ano muito duro para todos nós, militares no CTIG. E no local da Ponte do Rio Udunduma não foi diferente ou excepção. As orientações recebidas dos meus superiores, em particular do comando da CCS, de quem o “grupo especial” dependia logisticamente, assentavam num dualismo cartesiano [de René Descartes, 1596-1650], construídas na ideia de que de dia era para trabalhar, à noite era para estar vigilante. Enfim … já passaram quarenta anos.
Como não fomos para a Guiné em viagem de turismo, as alternativas eram escassas ou quase nulas, pelo que, a bem da defesa pessoal e da melhoria das condições de vida naquele contexto, lá metemos as mãos à(s) obra(s), levando-nos a alterar, significativamente, a sua paisagem por via de algumas benfeitorias.
Dito isto, passaremos em revista três dessas acções especiais, organizadas por fases, e que completam a primeira parte desta história da nossa vida colectiva.

A) – FECHO DO CONDOMÍNIO …

Fotos 7 e 8 – Estrada Xime-Bambadinca [Ponte do Rio Udunduma] – a primeira acção especial desenvolvida por elementos do 1.º GComb, da Cart 3494 [um grupo constituído por uma dúzia de militares = a 1 secção +], foi a delimitação do território, do então designado «Destacamento da Ponte», ou, ainda, por «Condomínio da Ponte». Merece relevo a elevada capacidade técnica de todos os seus executantes. [O 1.º, na foto 8, é o soldado Joaquim Cerqueira, do lugar da Valinha - Amarante].
Tratou-se de uma experiência de alto valor pedagógico, na justa medida em que fez apelo à motricidade fina do efectivo aí residente, por via de não existirem protecções das mãos, vulgo luvas, na manipulação do arame farpado. De referir, que esta acção aconteceu na época das chuvas.

B) – CONSTRUÇÃO DE NOVAS MORADIAS …


Fotos 9 e 10 – Estrada Xime-Bambadinca [Ponte do Rio Udunduma] – as imagens dão conta do modelo de arquitectura da nova moradia T1. Era rectangular, com duas águas, e tinha dois quartos e uma sala de jantar, mas não havia comer. Os alimentos, confeccionados em Bambadinca, na CCS, chegava-nos às diferentes horas do dia, segundo a sequência das refeições.
O edifício foi construído junto ao caminho da “estrada antiga” [picada].
Como estará hoje?

C) – CONSTRUÇÃO DA “ROTUNDA DA PONTE” – A 1.ª NO MATO …


Fotos 11 e 12 – Estrada Xime-Bambadinca [Ponte do Rio Udunduma] – as imagens referem-se à «Rotunda da Ponte» que decidimos construir [sem projecto, logo sem aprovação autárquica] como ícone da CART 3494, através da reprodução do seu símbolo. Para a sua construção foi utilizado o cimento sobrante da moradia e as pedras foram retiradas dos espaços envolventes da nova ponte. Para sinalizar a aproximação à rotunda foi pintada a base [disco] de um bidão de gasóleo com “obrigatório circular” e colocado em local visível, na extremidade de um tubo de ferro. Como curiosidade, todos os veículos que por lá passavam [em particular o jipe do CMDT OP do BART 3873], os seus condutores cumpriam o código da estrada.

D) – INSTALAÇÕES DE APOIO …

Foto 13 – Estrada Xime-Bambadinca [Ponte do Rio Udunduma] – imagem referente às óptimas condições higiénicas do aldeamento … de muitas estrelas … sobretudo nas noites de luar.
É possível, ainda, observar os nossos animais da/de companhia, em processo de socialização… e de solidariedade.
Com esta imagem, damos por concluída a primeira parte da história referente à nossa passagem pela Ponte do Rio Udunduma – 2.º semestre de 1973.
Espero que tenham gostado de a ler, independentemente de aqui e ali ter utilizado alguma ironia e imagens metafóricas, e de ver as imagens seleccionadas.
Como complemento, acredito que a narrativa tenha servido, quiçá, como elemento de recordação de outras memórias de muitos de Vós, que por lá passaram, e que ainda estamos a tempo de dar conta neste espaço de partilha que é o nosso blogue.
Aguardo.
Um forte abraço para todos os Fantasmas do Xime, com muita saúde e energia.
Jorge Araújo.
Nov./2013.

Vd posts: 148152  191 e CART 3494 

2 comentários:

joaquim disse...

Estive na Ponte do Udunduma com o Pel Caç Nat 52, se bem me lembro, de Agosto de 72? a Talvez Novembro de 72, altura em que fui para o Mato Cão.

As instalações eram inqualificáveis, se me não falha a memória.

O vosso convívio este ano vai ser perto de minha casa motivo pelo qual se calhar e se me quiserem aceitar e eu puder, estarei convosco.

Um abraço
Joaquim Mexia Alves

https://cart3494guine.blogspot.com/ disse...

Olá Mexia Alves,
É claro que te aceitamos com muito gosto, afinal pertences à mesma família, por outro lado quero lembrar, o António Bonito já o fez, deves ter em conta a data do encontro da Tabanca Grande por forma a não coincidir com o nosso dia.

Um abraço,

Sousa de Castro